LYRIOS

Sinceramente Marie, nunca ouvi tamanha asneira - Exaltou-se Francesco - Como podem pensar assim?! Homens livres, iluminados, isso é mesmo um absurdo! De Anne e do Major tão refinados e cultos...E amáveis, por Deus Marie, por Deus!

-Reparou que Anne ou o Major, não citaram o nome de nenhum amigo ou vizinho. Quase todos evitam a família, assim como devem passar a evitar-me quando virem nossa proximidade!Se o chamam para algum evento é por puro “respeito” à posição do major

-Entendo-te minha irmã, papai e mamãe nos deram uma educação livre no pensar e no agir, sem preconceitos.Lembro-me com perfeição de cada modernidade de papai; aulas de esgrima para uma menina, que escândalo, livros: as maiores novidades da Europa, filósofos, pensadores, revolucionários, sem perder o fio cristão que para ele era o mais importante, Deus na pessoa de Jesus é o maior pensador e renovador da historia.Ah papai, quantas inovações...Quantas saudades...

-Lembra-te Francesco?Como eu não podia freqüentar uma faculdade, papai contratou os melhores professores e fez em casa uma faculdade só para mim, não permitiu que me casasse antes do que ele previa, só para completar o tempo dos estudos, posso dizer que sou a única mulher com uma formação de homem no sentido de estudos.

-Marie, eu bem sei que és melhor que qualquer homem que conheço em varias matérias, tais como: filosofia, historia, música, teatro, além de falar outras três línguas.-ria-se Francesco.-Papai nos instruiu muito bem, principalmente a si.-Continuou.

-Eu era a filha preferida dele! E também a única.-disse em tom de riso.

-Uma educação livre isso sim!Foi o que tivemos!-Confessou em tom de nostalgia.

Depois disso nos calamos, reclinei no banco da carruagem e apesar dos solavancos tive um sono que me pareceu roubar do mundo de problemas em que eu estava mergulhada, levando-me a um jardim onde via o Major Rêveri, era um jardim muito bonito, mas um tanto estranho; para que eu chegasse até o ele tinha que passar por umas rosas que pareciam tentar atrapalhar-me.Quando olhei de novo só vi meu querido Forreli, que ao ver-me, apertou-me entre seus fortes braços, ficamos parados por algum tempo que no sonho perecia uma eternidade.

Infelizmente fui acordada por Francesco, acabávamos de chegar ao ponto que seguiríamos de barco, somente por algumas horas, até o continente Africano.

Almejava aquele momento, de conhecer outro mundo que não fosse feito de tantas formalidades, etiquetas e histórias antigas de “nobrezas”, títulos e reverencias totalmente desnecessárias e dispensáveis, um lugar onde eu poderia ver o ser humano puro, sem tantos moldes, ou seja, humanos livres.Um lugar novo.

Durou algumas horas a travessia da Espanha para a África, mas minha ansiedade era tanta que foi como se passasse quase um dia inteiro, além do mais tinha que cuidar de Francesco que enjoava sem parar, até febre lhe deu.

Chegamos.Já se fazia tarde, não se via ninguém no cais somente alguns marinheiros europeus que esperavam as cargas e alguns passageiros.Fomos direto a uma hospedagem.

Francesco e eu dormimos profundamente, cansados de uma longa viagem.Sem me dar conta acordei, já passava das três da tarde, como só podíamos seguir viagem no outro dia não me preocupei.A esta altura os generais que cuidavam de meu marido enviaram uma carta já à parte de nossa localização nos tranqüilizando a respeito de sua saúde.

Estávamos numa pequena cidade a beira do mar Mediterrâneo.Lembro-me da primeira visão que tive ao abrir a janela do quarto em que eu estava: uma confusão sem fim, pessoas passando de um lado para o outro, um mercado livre, pessoas correndo, outras comercializando, comercializavam de tudo, de pepitas de ouro e pedras, a animais, comidas, grãos tudo que fosse possível vender e tirar dinheiro para suprir a fome que passavam.Por outro lado havia exploradores com seus “empregados”, muitos dos quais crianças, para mim o inferno não parecia ser pior para aquelas pessoas do que aquela vida de miséria e sofrimento e ainda mais mães com crianças de colo subnutridas.Muitas vezes, pensava... “Meus Deus que horror” e fazia uma prece para que aqueles sofrimentos não fossem tantos.Isso era tudo que eu não queria ver.